09/11/2014

ARTESANATO - AS CAMISOLAS POVEIRAS

Camisola Poveira
Fotos: Município de Póvoa de Varzim



A camisola poveira bordada é feita em lã branca de fio grosso, da zona da Serra da Estrela, denominada “lã poveira” e decorada a ponto de cruz, com motivos de inspiração diversa (escudo nacional, com coroa real; patinhos; siglas; remos cruzados; vertedouros; etc), sendo somente utilizada lã de cor preta e vermelha nos bordados.

“A camisola poveira era inicialmente (1ª metade do século XIX) feita em Azurara e Vila do Conde e bordada (ou marcada) na Póvoa pelos velhos pescadores. Em evolução, passou a ser bordada pelas mães, esposas e noivas dos pescadores, e depois feita e bordada na Póvoa” (1)

Esta peça integrava o traje masculino de romaria e festa do pescador poveiro, cuja origem remonta ao primeiro quarteirão do século XIX. Este traje branco ou de branqueta (tecido manual) foi o que mais perdurou, mantendo-se até finais daquele século, sendo sempre o traje escolhido aquando da presença de elementos da comunidade junto das mais altas individualidades políticas.
Com a grande tragédia marítima de 27 de Fevereiro de 1892, o luto decretou a sentença de morte deste traje branco, assim como de outros mais garridos. A camisola sobreviveu, ainda, pela primeira metade do séc. XX, mantendo-se como peça de luxo de velhos e novos.

A recuperação do vistoso e original traje branco deveu-se a António Santos Graça que, ao organizar o Grupo Folclórico Poveiro, em 1936, o ressuscitou e divulgou.
A beleza e o pormenor do trabalhado da camisola poveira não se resumem ao peito, embora seja a área objetivamente mais marcante. Também as mangas, o decote, as barras no punho, o remate junto ao ombro e na parte inferior são objeto de trabalhos com diferentes níveis de complexidade. A originalidade desta peça não está só nos motivos decorativos, mas também no seu modelo invulgar, tendo em conta o contexto do traje tradicional em que se enquadra. De mangas reglan, tem uma abertura à frente com um conjunto de pequenos torcidos que permitem abrir ou fechar o decote.

Esta peça sofreu naturalmente uma evolução ao longo do tempo. Inicialmente (séc. XIX) as camisolas eram mais simples, ficando a zona do bordado confinada praticamente ao peito. Com o correr do tempo, a valorização cultural do produto e a maior disponibilidade de tempo das artesãs, aumentaram significativamente o número de elementos bordados. Houve a integração de novos temas, chegando a ser comum bordar o nome do utilizador.
Paralelamente a este modelo de camisola bordada, do traje de luxo, as mulheres faziam e ainda fazem outro tipo de camisolas, de lã branca ou mesclada: a camisola poveira de pontos. Para a decoração destes modelos usam pontos em relevo como as tranças, os fachocos, etc.




A destreza neste tipo de trabalhos levou à diversificação de peças, daí surgindo os gorros, as luvas, as meias, os cachecóis, as carteiras… Bordados ou com pontos, estes artigos, para além da sua utilidade, entraram facilmente na moda pela sua beleza. Atualmente, a versatilidade deste produto tem atraído criadores do mundo da moda, inspirados por tendências revivalistas e por temáticas de raiz mais popular. Em 2006, o estilista Nuno Gama, na sua coleção de camisolas de lã, utilizou motivos usados na nossa camisola, aplicados por bordadeiras poveiras, segundo as técnicas tradicionais.

 (1)COSTA, Maria Glória Martins da – “O Traje Poveiro””, In: Póvoa de Varzim Boletim Cultural, vol. 19 (1980), p. 208-213





Sem comentários:

Enviar um comentário